André Fossati
Grupo dos Temerosos se apresentam antes da sessão em Januária
A rua de baixo em Januária por pouco não alcança o rio. Dona Narcisa que tem 80 e poucos anos se lembra da época em que a água chegava a invadir sua casa. Seu Binu com seus 100 anos e oito meses fala de um rio hoje quase morto. Andar pela rua de baixo é mergulhar na história e conversar com pessoas centenárias. Em alguns casos a memória vacila. Como Dona Didi que nos conta a origem do nome Januária e no mesmo minuto se esquece do que foi dito.
Dona Maria de 96 anos é poeta. Seus poemas ela escreve na memória. Sabe os 12 escritos de cor. “Eu penso de fazer a poesia e vou juntando os verbos na rima”, explica. Não teve oportunidade de aprender a ler nem escrever. Mas as rimas são certeiras e os versos, um lamento. A amiga pediu para que fizesse um poema sobre a Itacarambi antiga. Mas as rimas não vieram na cabeça e até hoje Dona Maria não cumpriu o pedido. “É igual música, tem que ter rima se não vira o caos”, enfatiza
Seu Binu, marido de Dona Maria exibe uma caligrafia perfeita. Ele passou para o caderno um dos poemas de sua esposa que fala do Rio São Francisco. “Lagoa aonde passava a pé, logo passava a canoa. Rio de São Francisco a vida ninguém compra e a morte ninguém paga”. Eu pergunto por que seu Binu não registra no caderno todos os poemas de Dona Maria. “Ele não gosta muito de escrever , por que anda tremendo a mão”, explica Dona Maria
Do poema sobre São Francisco, ele se orgulha. Pega o caderno para recitá-lo, cola o olho nas folhas, por que seu Binu não usa óculos. Se perde um pouco nas palavras, mas conclui a leitura do poema e não esconde o orgulho em ainda poder ler sem usar óculos.
Seu Binu não escreve poemas nem é dado as rimas, mas se lembra com memória fotográfica das histórias fantásticas. “O mundo é encantamento. Quem quiser ver coisa nesse mundo, anda. É encanto, coisa que até Satanás duvida”, ele inicia dando vida para as narrativas que um dia podem morrer. Uma vez seu Binu foi para Barretos. Chegou lá e viu um elefante que bebia cerveja. Depois que o elefante encheu a cara, ele levantou as duas patas de trás e dançou igual gente. “Você duvida? Pode escrever com caneta de ouro”, completa. Seu Binu faz questão de ver a gente anotar tudinho. “Anotou aí?”, ele sempre pergunta.
“Dona Narcisa mulher de Berto Preto”. Essa foi a primeira frase de Dona Narcisa quando entramos em sua casa. Essa frase ela repete com freqüência. Sua memória só alcança a vida e os feitos de seu marido, famoso em Januária. Berto Preto era cantor de reis, trouxe os reis dos temerosos e quase todos os festejos tradicionais de Januária. “Era Berto Preto que marcava a dança de São Gonçalo”, lembra. Berto Preto já morreu tem tempo e Dona Narcisa se lembra da época de quaresma quando seu falecido distribuía peixe pela cidade.
Grupo dos Temerosos se apresentam antes da sessão em Januária
A rua de baixo em Januária por pouco não alcança o rio. Dona Narcisa que tem 80 e poucos anos se lembra da época em que a água chegava a invadir sua casa. Seu Binu com seus 100 anos e oito meses fala de um rio hoje quase morto. Andar pela rua de baixo é mergulhar na história e conversar com pessoas centenárias. Em alguns casos a memória vacila. Como Dona Didi que nos conta a origem do nome Januária e no mesmo minuto se esquece do que foi dito.
Dona Maria de 96 anos é poeta. Seus poemas ela escreve na memória. Sabe os 12 escritos de cor. “Eu penso de fazer a poesia e vou juntando os verbos na rima”, explica. Não teve oportunidade de aprender a ler nem escrever. Mas as rimas são certeiras e os versos, um lamento. A amiga pediu para que fizesse um poema sobre a Itacarambi antiga. Mas as rimas não vieram na cabeça e até hoje Dona Maria não cumpriu o pedido. “É igual música, tem que ter rima se não vira o caos”, enfatiza
Seu Binu, marido de Dona Maria exibe uma caligrafia perfeita. Ele passou para o caderno um dos poemas de sua esposa que fala do Rio São Francisco. “Lagoa aonde passava a pé, logo passava a canoa. Rio de São Francisco a vida ninguém compra e a morte ninguém paga”. Eu pergunto por que seu Binu não registra no caderno todos os poemas de Dona Maria. “Ele não gosta muito de escrever , por que anda tremendo a mão”, explica Dona Maria
Do poema sobre São Francisco, ele se orgulha. Pega o caderno para recitá-lo, cola o olho nas folhas, por que seu Binu não usa óculos. Se perde um pouco nas palavras, mas conclui a leitura do poema e não esconde o orgulho em ainda poder ler sem usar óculos.
Seu Binu não escreve poemas nem é dado as rimas, mas se lembra com memória fotográfica das histórias fantásticas. “O mundo é encantamento. Quem quiser ver coisa nesse mundo, anda. É encanto, coisa que até Satanás duvida”, ele inicia dando vida para as narrativas que um dia podem morrer. Uma vez seu Binu foi para Barretos. Chegou lá e viu um elefante que bebia cerveja. Depois que o elefante encheu a cara, ele levantou as duas patas de trás e dançou igual gente. “Você duvida? Pode escrever com caneta de ouro”, completa. Seu Binu faz questão de ver a gente anotar tudinho. “Anotou aí?”, ele sempre pergunta.
“Dona Narcisa mulher de Berto Preto”. Essa foi a primeira frase de Dona Narcisa quando entramos em sua casa. Essa frase ela repete com freqüência. Sua memória só alcança a vida e os feitos de seu marido, famoso em Januária. Berto Preto era cantor de reis, trouxe os reis dos temerosos e quase todos os festejos tradicionais de Januária. “Era Berto Preto que marcava a dança de São Gonçalo”, lembra. Berto Preto já morreu tem tempo e Dona Narcisa se lembra da época de quaresma quando seu falecido distribuía peixe pela cidade.
Pâmilla Vilas Boas
Seu Binu ganha o CD com o filme da cidade. Ele aparece no filme.
Se a rua fosse minha
A rua de baixo é poesia que se escreve no presente. Num passado não muito distante, Digão conta que a rua sofria com a criminalidade e com o preconceito dos moradores de outras regiões. Em Januária, a briga entre bairros era coisa comum. Os outros moradores não caminhavam pela rua de baixo e quem morava lá não era bem visto no resto da cidade. “A rua de baixo sofria com as drogas e com as crianças que eram levadas para o tráfico”, explica. Para reverter a situação, Digão começou a realizar trabalhos sociais, no começo, sem muita estrutura.
Quando ele teve a idéia de juntar esporte e cultura, a realidade começou a mudar. “O projeto abriu as portas para as comunidades. As crianças criaram amizade, influenciou os pais e a convivência melhorou”, conta. Isso por que Digão explica que a idéia era promover uma interação entre os bairros e as aulas de música, os esportes são abertos a toda a cidade.
“A métrica rica e viva na voz do povo”. No filme o “Homem que engarrafava nuvens” essa é a descrição da pureza magnífica dos versos das músicas nordestinas. Hoje na sessão de cinema o grupo dos Temerosos da rua de baixo se apresenta para o resto da cidade. Temerosos, reis de bois, capoeira. Hoje a rua de baixo é referência cultural; é poesia viva.
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